domingo, 24 de agosto de 2008

Valsas e comprimidos...

O tempo tinha passado depressa demais pra linda menina que bailava ao som das mais belas valsas. A pureza do olhar, a delicadeza dos gestos, a doçura da voz, tinham ido embora com o passar dos anos. Duros anos, que transformaram aquela delicada amante da arte em uma forte e determinada mulher de negócios.

Aquelas belas valsas que tocavam na vitrola de sua avó quando ela era mais nova, foram trocadas por desafinadas buzinas, milhares de vozes que tentavam uma sobressair sobre a outra, e diversos comprimidos para enxaqueca. Ela sentia falta daquelas melodias perfeitas, mas seu tempo livre era tão raro, que nem as melhores lembranças de sua infância arranjavam um lugar nele.

Aliás, ela acabava de se repreender por se pegar cantarolando, mais uma vez, aquela valsa, do segundo espetáculo que ela tinha feito quando criança. Essas distrações estavam se tornando cada vez mais comuns, mesmo ela fazendo de tudo para esquecer dessa nostalgia "estúpida" (pelo menos era o que ela dizia a si mesma para se convencer) e voltar aos negócios. Fazia muito tempo que ela trabalhava para conseguir esse importante projeto e não ia deixar nada atrapalhar. Nada.

Rascunhos e projetos na sua frente. Notas e melodias na mente. Água e remédios na mesa. Lembranças e valsas na cabeça. A caneta sendo usada cada vez mais forte. A música tocando cada vez mais forte...

Ela queria fugir. Talvez todos queiram fugir, mas poucos tenham coragem pra isso. E ela, os olhos viajando entre os comprimidos e as chaves, se indagava se teria a coragem necessária para abandonar tudo. Ela sabia que era um caminho sem volta. Se fosse embora naquele momento, sabia que uma nova vida começaria, e tudo que fora conquistado até o momento ficaria pra trás.

Os olhos continuavam viajando. Comprimidos, chaves, indecisão, atitude, certo, duvidoso. Os olhos pararam por um momento. E o brilho do metal das chaves era refletido no brilho do seu olhar. A decisão estava tomada. Já passava da hora de escolher.

Num brusco movimento, sua mão direita parou sobre o molho de chaves. A mão esquerda, livre, serviu para abrir a gaveta ao lado. Guardou a chave lá dentro, pegou o copo d'água, um comprimido para enxaqueca e engoliu. Um talvez fosse pouco, então engoliu outro, só por garantia.

Sorriu, por se achar tão idiota ao ponto de cogitar a idéia de largar tudo. Ela sabia que nunca faria isso. Seu passado de bailarina não passava disso. De passado. As valsas aos poucos iam cessando. O som dos rabiscos nos papéis foi tomando o ambiente. A bailarina não bailava mais. Pelo menos não as velhas valsas...

30 comentários:

Arthur Lopes disse...

pois é, como diria o poeta cazuza:"o tempo nao para e a gente ainda passa correndo."sinto que a nostalgia tomou conta de nossos textos,mas o importante mesmo eh que o seu tá bem escrito pra caralho como sempre.abraço meu primo,continue assim

Anônimo disse...

Adorei o texto .. tanto .. que não sei oq comentar.. rsrsr

Sabe quando se imagina cada sena.. até o suspense será que ela vai relamente abandonar tudo e sair daquela sala ... rsrs...

quanto não tem vontade de fazer isso e sentir um minuto de paz consigo mesmo.. poder ficar com seus pensamentos, lembraças.. e tudo mais ... mas não 'pode" ..

Eita vida hem??? rsrsrs

adorei .. abç...

Unknown disse...

Parabéns, seu texto é ótimo. E quer saber? Acho que a meninas nunca abandonam a valsa, por mais que transformem sua vida em negócios. A sensibilidade faz com que tudo vire música aos ouvidos, até o barulho das businas.
Um dia a gente nasce, outro dia, descobrimos que crescemos. E talvez, qdo isso acontece necessitamos de chaves e comprimidos, mas levamos a valsa dentro da gente, sempre.

Convido a visitar meu blog:
www.espelhomagic.blogspot.com

bjs

Anônimo disse...

ai, que triste..
eu achei que ela ia!
ah, ficou muito bom (:
;*

Rodrigo disse...

Muito tocante ^^

Jamile Gonçalves disse...

És baiano ou não és?
Volta pra tua terra rpz! Nem que seja se passagem!
Mais um dos talentos da nossa terra! [você, sem dúvida]

Adorei seu modo de escrever
beijos

Unknown disse...

Eu de certa forma me identifiquei com a persogem, eu já largeui tudo, para passar o dia tomando iogurte com o dedo...

Parabéns pelo texto...


Abraços!!!


http://hdebarbamalfeita.blogspot.com/

Paulão Fardadão Cheio de Bala disse...

Raindrops keep falling on my head... Tinha uma caixinha da mãe q tocava isso. Nunca mais me saiu da cabeça.

Outra tocava Black Diamonds, e em algum lugar ouvi Pour Elise. por isso sou sabido assim hoje em dia.

Anônimo disse...

Muito massa teo blog :DDD
Boa semaana ;DD

http://tiomah.blogspot.com

.D

Unknown disse...

Ai Ai Puime...
Você sempre surpreendente! e cada vez melhor! Sabe que eu tenho um suuuuuper carinho no texto dos "Girassóis" (será pq, hein? xD)
Mas esse, sem dúvida foi impecável!!!
Parabéns!!
Beijos, saudades das sua presença nos corredores, viu?!

Euzer Lopes disse...

Acho que a poderosa mulher de negócios não conseguiu matar a menina sonhadora dentro dela.
E acho que, mais dia menos dia, essa menina vai vir cobrar dívidas de um passado, tapar buracos que o hiato da vida adulta deixou abertos.

Anônimo disse...

ola, sou o postador do CINEMA E PIPOCA e vc lembrou mt bem, mariana ximenes fez sim UM COPO DE GELO E DOIS DEDOS DAGUA (ou algo parecido com isso). vlw mt pela visita

Anônimo disse...

Fiquei curiosa em ler a pessoa que trocou saudade por ódio da "fessora" de português...

Pra começo de conversa, gostei do nome do blog, reticências é o meu sinal de pontuação preferido, detesto o ponto final. (o nome do blog já está relacionado à Gramática).

pra terminar, li o seu texto todo, e por ele, percebi que, apesar de odiar, vc aproveitou bem as aulas de Língua Portuguesa ;)

Seu texto está muito bem escrito. Parabéns.

Bjokas
Raquel

Thiago Lopes disse...

Parabéns meu camarada...tu escreve muito bem, gostei do texto.

Jonatas Fróes disse...

Não sei porque, mas me identifiquei muito com a história. Já abandonei tudo por nada hehehehe xP

[]'s

Musikaholic

blog do dudu santos disse...

Cara!! vc é bom escritor, parabéns pelo blog, pelo seu talento, legal esta sua forma direta e sincopada de expor seus temas
abraço

Unknown disse...

Muito bem escrito o texto.. Parabéns!

Cris Medeiros disse...

Obrigada pela visita! Beijos

Ana Lívia disse...

e as bailarinas são sufocadas por aí...
odioso destino.

obrigada pela visita...
volte sempre e sempre.
adorei seu blog.
belo!
muito belo...
...o blog tb!
srsrsrs
beijo

Kel disse...

Se ela sempre quis ser essa mulher de negócios que ela é hoje, a tristeza que fica no ar não é verdadeira.
Ela não deve voltar atrás e bailar valsas com antigamente, deve continuar com seus panos futuros...
É o q penso.
beijo :*

Camila :) disse...

ooieee,
olha nem li seu post
teem aviso no meu blog :)



teeh maais
;*

RENATA CORDEIRO disse...

Ai, que raiva! Eu aqui torcendo para a mulher largar tudo, mas é preciso coragem para isso e ela não teve.
Gostei do seu conto, muito. Vi vc no Blog do Dudu e resolvi ver como era o seu. Gostei do que vi. O meu Blog é sobre crítica ou resenha de filmes, depende do filme, depois há uma homenagem a um pintor, intercalo semanalmente um estrangeiro e um brasileiro, a seguir publico os artistas plásticos da Blogosfera que conheço, inclusive o Dudu que me retratou numa aquarela, em seguida publico poemas de amigos blogueiros para que fiquem conhecidos e, por fim, encho o Blog de rosas, ao final das quais há uma casinha e um banco para descanso e o meu castelo. Como o post é longo, falo a todo mundo para pressionar a tecla "Page Down" e parar onde quiser. O post vai ficar lá, volte no dia seguinte, não precisa pôr comentário, leia e aprecie à vontade. O filme de que falei a semana passada foi "James Dean: uma vida inventada", com o James Franco no papel-título. O desta semana é "Apocalypse Now". Gostaria muito que vc fosse lá, como meu convidado especial, porque gostei muito do seu espaço.
Um beijo,
Renata
wwwrenatacordeiro.blogspot.com

Augusto disse...

Belo texto. Um final triste. Porém a com um desenrolar muito bom. Acredito que todos queriam um final diferente. heheh Muito bom

Anônimo disse...

Muito bom...
=)

"Ela sabia que era um caminho sem volta. Se fosse embora naquele momento, sabia que uma nova vida começaria, e tudo que fora conquistado até o momento ficaria pra trás."

Unknown disse...

aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaê! aleluiaaa! o//
manda beinzaaaão! o// quando lançar um livro, eu vou na noite de autógrafos, tá? =)

beeeeeeeeeijo grandeee google boy :*

Marco Alcantara disse...

Você escreve bem cara.

Gosto causos do acaso.

Dedinhos Nervosos disse...

Gosto de realidade na "fic�o". Eu tb n�o iria. Sou pr�tica e com a grana do projeto (que ela queria conquistar), ela pode ir pra fora, ver o Bolshoi. Bjo.

Denise Machado disse...

Seus contos, como sempre, são surpreendentes.

Anônimo disse...

Você ganhou uma indicação para o selo DARDOS. Caso, aceite, busque em : http://devaneioseloucuras-raquel.blogspot.com/

Bjokas
Raquel

Fê Collini disse...

Eu tbm não largaria, com certeza absoluta